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Adotar não é “fazer algo bom para o mundo”!


A escolha pelo Serviço Social ocorreu muito naturalmente enquanto ainda me preparava para o vestibular, sempre me causou muita indignação e tristeza as dificuldades sociais, econômicas e o desrespeito que muitas pessoas viviam em relação aos seus direitos mais fundamentais. A área da infância e juventude foi se tornando presente na minha caminhada profissional e fui me apaixonando, em especial por se tratar de uma fase fundamental na formação de todo ser humano. Já o trabalho com a adoção não foi uma escolha, mas uma feliz consequência e atualmente me encontro encantada por este universo, pela possibilidade de vidas serem transformadas e receberem novas oportunidades.


Tem aumentado a procura por adoção nestes últimos anos?

Não possuo números oficiais ou estatísticas que possam embasar esta resposta, mas na minha experiência no meu local de trabalho, consigo analisar que tem havido um movimento maior de busca pela adoção. Ainda existe uma busca maior por casais ou pessoas que, por diversos motivos, não puderam gerar filhos biológicos, no entanto, também tenho observado um discreto aumento de famílias com filhos ou com possibilidades de gerar, que também estão encontrando na adoção mais uma maneira para se tornarem pais.


Muitos casais pensam em adotar, mas por onde eles podem começar? O primeiro passo é buscar a Vara da Infância e Juventude da sua região, embora a lei 12.010, que regulamente a adoção no nosso país, seja nacional, cada local tem as suas especificidades. Existe uma lista de documentos que deve ser apresentada, além da exigência dos pretendentes se submeterem à uma avaliação psicossocial. Muitos pretendentes à adoção julgam o processo como burocrático e demorado, mas do meu ponto de vista é necessário e importante no processo de garantia de direitos, em especial para as crianças que precisam de uma nova família.

O intuito da legislação e das exigências impostas é privilegiar aqueles que pretendem e buscam os meios legais para adotar e garantir que as crianças sejam inseridas em famílias realmente disponíveis e preparadas para vivenciarem as vicissitudes da adoção.



O que o casal deve analisar antes da decisão?

Quem pensa em se tornar pai e mãe por meio da adoção precisa, primeiramente, avaliar suas motivações, não deve ser pela via da benevolência ou caridade, ou seja, motivado pelo desejo de “fazer algo bom para o mundo ou para alguém”.

Como já disse anteriormente, muitos buscam a adoção por não ter sido possível gerar um filho biológico, o que é legitimo, mas é necessário que esta decisão seja amadurecida e ponderada e não pautada em possível substituição para um filho sonhado e idealizado. Uma vez tendo compreendido suas reais motivações, é importante que se busque informações fidedignas à respeito da paternalidade e filiação adotiva, para superar a idealização e os medos naturais que surgem no decorrer deste processo. Os grupos de apoio a adoção costumam ser bons locais para conhecer histórias de famílias que vivenciam à adoção, assim como as diversas dificuldades que podem ser enfrentadas e superadas.


Ainda existe muito preconceito para a adoção de crianças maiores?

Ainda é muito difícil que pretendentes optem pela adoção de crianças mais velhas, em geral por desejarem vivenciar todas as fases do desenvolvimento do filho, mas também por entenderem que crianças maiores podem já virem para a nova família com memórias e hábitos ruins da família biológica.

O maior preconceito é acreditar que uma criança, independente de sua idade, não teria a capacidade de ressignificar suas vivências negativas e criar novos laços afetivos.

Qual a principal diferença entre a criação de um filho adotivo e um natural?

Não acredito que deva existir diferença na criação de filhos, sejam biológicos ou adotivos, mas claro existem as particularidades de cada um, assim como também em famílias com mais de um filho, cada criança é única e possui necessidades únicas. Os limites, regras e relações de afeto devem ser os mesmos, sem qualquer diferenciação. A principal diferença está no fato do filho adotivo possuir uma história antes de chegar na família e acredito no direito deles terem o conhecimento de sua verdadeira história, claro, respeitando a capacidade de compreensão de cada faixa etária.


Qual a mensagem/conselho que você deixa para quem tem vontade, mas ainda é resistente à adoção?

A adoção é algo comum na vivência de cada um, se pararmos para pensar adotamos cotidianamente, nossos amigos, nosso cônjuge, a família do nosso cônjuge…

São pessoas por quem desenvolvemos relações de afinidade e afeto, independentemente da origem biológica ou social, e se tornam também a nossa família. Ter um filho por meio da adoção deve ser uma decisão muito amadurecida e ponderada, a adoção, acima de tudo, é a relação de amor genuína vivenciada entre pais e filhos, sendo assim, apenas pessoas que se dispõem a ter esta vivência devem considerar a parentalidade adotiva.

Posicionamento pessoal

Sou antes de tudo cristã, cresci em um lar onde Jesus Cristo sempre foi o Senhor e Salvador, sendo assim, acredito que minha escolha profissional é um reflexo de tudo que sempre acreditei a respeito de como devemos ser enquanto cristãos.

Para mim, ser como Cristo na nossa sociedade é expressar o amor de Deus por meio de atitudes que levem respeito e dignidade à vida humana. Amo minha profissão e meu trabalho, mas me causa grande angústia lidar com os meus limites de atuação.

Como quando preciso receber uma criança que está sendo devolvida por famílias que pretendiam adotá-la ou quando não consigo encontrar uma família para crianças que são maiores ou são da etnia negra. Sei que não cabe a mim exclusivamente trazer solução para todas estas questões, mas sinto-me responsável por cada criança cujo o processo chega à minha mesa.

Por este motivo, a cada dia de trabalho procuro consagrá-lo a Deus, peço para cada criança e cada processo que preciso trabalhar.

A minha oração diária é que o meu trabalho seja para honra e glória do nome de Deus, para que a minha postura e atuação profissional seja um testemunho da Graça e Misericórdia do Senhor em minha vida.

Minha opinião sobre Adoções Ilegais:

É importante tocarmos em um assunto delicado, mas que infelizmente ainda ocorre muito, as adoções que são feitas por meio da ilegalidade. Muitas pessoas, por considerarem o processo muito complicado ou simplesmente por não aceitarem se submeter à lei, optam por adotar crianças por meios que são considerados ilegais.

Exemplos: conhecer uma mulher gestante e quando o bebê nasce começam a cuidar como seu, ou o marido registra uma criança como sua e depois a esposa solicita uma adoção unilateral alegando ter sido fruto de caso extraconjugal. No Brasil são tão comuns as adoções ilegais que existe um termo específico para caracterizá-las, “adoção à brasileira”.


Porque isto é tão ruim?

Quando a adoção ocorre sem o amparo da lei não há nenhuma garantia que a criança está inserida em uma família que possua reais condições de garantir seus direitos fundamentais e, por outro lado, a família adotiva fica exposta aos riscos de, à qualquer momento, a família biológica se arrepender ou exigir vantagens para não lhes tirar a criança. Dependendo do caso, em especial quando o tempo de convivência da criança com a família adotiva não é muito grande, se chegar ao conhecimento do judiciário a adoção ilegal, pode-se determinar a busca e apreensão da criança.

Eu pessoalmente acredito que nenhuma relação iniciada com mentiras e enganações pode ter um futuro bom, no mínimo esta criança terá sua origem ocultada ou mal contada. Logo, se alguém deseja adotar uma criança o caminho é buscar a Vara da Infância e Juventude de sua região, nunca aceitar propostas de “conhecido de uma prima de uma grávida que não poderá cuidar do bebê”, certamente esta não é a forma correta de se tornar pai ou mãe por meio da adoção.

Patrícia Macedo Conrrado Silva, Assistente Social Judiciário do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, pós graduada em Políticas e Práticas de Promoção Social pela Faculdade Paulista de Serviço Social. Já atuou em Serviço de Acolhimento Institucional para crianças e adolescentes e no Centro Hospitalar do Sistema Penitenciário de São Paulo.


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