Fila no caixa. Eu com mais um teste de gravidez nas mãos. Me sentindo uma verdadeira pateta. Só naquele ano era o décimo ou décimo primeiro teste. O caixa olha friamente para mim, passa o código de barras e eu pago. Vai no débito. Sentindo meu dinheiro arremessado da janela mais uma vez.
O que será que acontece? Mais um ano e nada. Mais outro e nada. Mais outro e mais outro… Cirurgia marcada. Pequenos pólipos no canal do útero e pequenos focos de endometriose. Uau, agora sim descobrimos o motivo. Cirurgia feita, sucesso. Passou mais uma ano e nada de engravidar. Então vamos partir para uma inseminação artificial.
Nossos olhares se encheram de esperança. Sala de espera pré procedimento. Pessoas não se olhavam, nem se falavam…deve ser vergonha. Sei lá. Assinamos o contrato. Inseminação feita. Resultado negativo.
Então não deu certo a inseminação, mas a fertilização tem mais chances de sucesso. Humm, não sei não, mas por vias das dúvidas, vamos lá novamente para o abate! Juntamos nossas reservas e lá vamos nós. Compra de medicamentos. Tudo em caixas de isopor e agulhas para a autoaplicação. Inocentes agulhas que serão espetadas em minha barriga, 1 ou 2 a cada dia, não me recordo muito bem graças a Deus, mas sei que não foi simples.
Tudo bem. Todo sacrifício vale a pena. Estimulação ovariana ok, ultrassons ok, vamos lá, agora é retirar os óvulos e fazer a fertilização. Tudo caminhou muito bem. O médico segurou na minha mão e disse: blastocistos de excelente qualidade, nota A. Foram aprovados com mérito. Como pode não dar certo! Pois é, não deu.Chega! Vamos viajar e ser feliz.
Com o emocional abalado, as economias gastas e a estima pra lá de baixa. Saí do meu trabalho, vou “desestressar”, mudar os ares. Vamos pensar em outras coisas que vão além de visitas ao ginecologista.
Foi assim por um tempo, vivemos nossas vidas, curtimos um ao outro, começamos um novo curso de teologia, viajamos, nos dedicamos à obra de Deus, assistimos as melhores séries do Netflix. Porque algo falava dentro de mim: Viva o momento sem ficar planejando o futuro. A vida passa rápido, não fique lamentando o que você não tem hoje. Agradeça o que você tem.
Isso ficou latente dentro de mim. Quando vivemos em função do que não conseguimos alcançar, isso pode se tornar uma obsessão e, o que era pra ser doce, torna-se amargo.
Pergunta: qual o objetivo do seu relacionamento?
Seria muito raso e sem amor dizer que é ter filhos. Sim. Eu não acredito que o objetivo de um casamento sejam os filhos. Casamento envolve muito mais aspectos, nuances e descobertas. O casamento é uma estrada com placas para vários caminhos que nos desviam do destino certo.
Neste tempo Deus me ensinou a administrar as ansiedades, medos e cobranças. Ele me dizia: não perca tempo pensando nisso. Viva o hoje!
Gosto muito desta canção: “Não tenha sobre ti um só cuidado qualquer que seja, pois um, somente um, seria muito para ti. É Meu, somente Meu todo trabalho e o seu trabalho é descansar em Mim.” Milad
Descansar?!??!
Que verbo difícil de ser conjugado. Você já se imaginou deitado, bem relaxado na palma da mão de Deus? Pois é assim que Ele gosta que a gente fique, des-can-sa-do.
Mas por que ainda não sou mãe?
Parei, só que não, de refletir sobre isso. Se Deus tem o controle de todas as coisas, deve ser porque não é o momento ou, de repente, não serei mãe. Temos muitos sobrinhos, já está ótimo. Eu e meu marido já estávamos convencidos disso.
Deus colocava isso no meu coração: aproveita enquanto não é mãe. Eu acho uma grande roubada, não só nessa, mas em outras fases da vida, não se concentrar no que temos no momento. Meu conselho é: seja criativo com o que tem em mãos. Não deseje o que não é seu, o que você não pode ter, isso pode tornar você uma pessoa frustrada.
Procure alegria na vida que Deus te deu. Não estou dizendo para você não ter sonhos, estou dizendo para você não deixar que a obsessão tire a sua alegria e a paz no relacionamento. Senão você pode perder momentos que não voltam, que são presentes de Deus, mas você não quis nem abrir, porque imaginou que o embrulho pudesse ser maior.
É isso, Em meio a todos estes pensamentos fui sendo tomada por uma certeza de que o melhor estava por vir.
No ano seguinte resolvemos tentar outra fertilização. O local era longe. Tive que fazer idas e vindas constantes, afinal não estava mais trabalhando em local fixo o que permitia isso.
Sala de espera lotada! Muitas vezes fiquei me perguntado, o que estou fazendo aqui? Saía de lá com um vazio no peito. Todas aquelas mulheres, casais, cheios de esperança, traumas e na luta como eu. Lembro de uma mulher que andava de um lado para o outro, meio frenética. Ela insistia em falar com um dos médicos. Parecia que não estava aceitando o resultado negativo de gravidez.
Meu Deus! Pensei comigo: não quero ficar assim. Vontade de sair correndo de lá, mas me mantinha firme e forte. Um novo procedimento de fertilização estava por vir. Tudo de novo: injeções, idas e vindas aos ultrassons, expectativas novamente à flor da pele. Fizemos nossa segunda fertilização. Resultado negativo.
Chega! Agora não dá mais.
A médica disse que eu tinha mais um “embrião”. Pedi que colocasse logo. Ela não quis colocar, pediu que eu esperasse mais um mês. Foi então que resolvemos desistir e congelar este único que restou. Passando o tempo, decidimos que nunca mais faríamos outro procedimento destes e que este “embrião” ficaria congelado e doado para pesquisa de célula tronco. Faríamos um bem para a humanidade.
Passou um ano. A funcionária do laboratório nos ligou e disse sobre o vencimento do contrato de locação da geladeira. Disse a ela que iríamos doar, mas que só iria conversar com o meu marido a respeito. Precisava responder logo para eles. Foi neste final do segundo tempo que comecei a pensar com carinho no assunto e a relembrar todo o sacrifício que passamos e que agora ia ser muito mais simples, porque já estava tudo pronto, era só colocar. Diminuímos nossas expectativas e não fizemos alarde.
Ao sair da sala de procedimento, rumo à porta de saída, a médica me chama e diz que o meu embrião ia ser um gatão, que ele estava muito bom. Apesar da brincadeira, fiquei bem esperançosa, ela transmitiu uma certeza muito grande para mim.
Percebi pela fome violenta que me atacou que algo estava diferente. A notícia veio: positivo! O quê? Isso mesmo. Estou grávida. Não dava pra acreditar. A alegria era tamanha que não cabia em nós!
Deus me ensinou muitas coisas neste tempo,
uma delas é que precisamos recriar a nossa vida a todo momento, encontrar novos desafios, ser flexível para aceitar mudanças, sair do quadrado de nossas próprias ideias, compreender que nem tudo é como planejamos e, principalmente, não tentar achar o culpado, mas sim tentar achar um novo significado para a nossa história.
Hoje o Vitor veio desarrumar a nossa vida, encher de cores, de sons, de sorrisos, veio para quebrar nossos conceitos, renovar nossas manhãs. Ele olha profundamente, ninguém passa despercebido, olha até arrancar um sorriso.
Esse é o meu menino. Ele ressignificou a nossa vida antes mesmo de chegar. Tudo valeu! Obrigada meu Deus! Obrigada a tantos que desejaram e oraram por este milagre.
por Drica Reis
Publicitária e Coidealizadora do Mães com Fé
Comments